Jovem médica-veterinária supera adversidades e se forma com louvor: Camila Borges Belo de Moraes recebe CIP durante solenidade no CRMV-RJ

Aos 23 anos, Camila Borges Belo de Moraes carrega consigo muito mais do que o título de médica-veterinária recém-conquistado. Carrega uma história de coragem, persistência e superação. Diagnosticada com uma condição neurológica rara, a jovem enfrentou desafios físicos e emocionais ao longo de toda a sua formação, concluída com êxito em novembro de 2023. Neste mês de maio, ela recebeu sua Cédula de Identidade Profissional (CIP) durante a solenidade realizada pelo Conselho Regional de Medicina Veterinária do Rio de Janeiro (CRMV-RJ), marcando oficialmente o início de sua trajetória profissional.

Moradora da Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio, Camila utiliza cadeira de rodas desde os 13 anos. No entanto, os primeiros sinais da condição surgiram ainda na infância, aos cinco anos, quando começou a apresentar alteração na marcha. A família percorreu um longo caminho até obter um diagnóstico definitivo.

“Procuramos ortopedistas, fizemos raio-X de membros inferiores, quadril… mas nada aparecia. Só que foi piorando. Aos oito anos, ela perdeu a coordenação motora fina e, aos dez, precisou trocar os cadernos pelo computador”, conta a mãe, Cátia Aparecida Borges Belo de Moraes.

Foi apenas em 2023 que os médicos chegaram ao diagnóstico correto: DYT-28, também conhecida como KMT2B-related dystonia ou distonia 28 de início na infância, uma distonia genética extremamente rara, que afeta o controle motor e provoca rigidez muscular e movimentos involuntários.

“Ela vai fazer 24 anos este ano e só em 2023 tivemos a confirmação do diagnóstico, depois de quatro painéis genéticos, ressonância de cabeça, exames metabólicos… tudo sem resposta. Até que, em agosto do ano passado, um médico me ligou: finalmente encontraram a etiologia”, relembra a mãe.

Em meio aos desafios, Camila contou com o apoio incondicional da família – especialmente da mãe, que tomou uma decisão corajosa e incomum: precisou conciliar a nova rotina com a carreira de enfermeira, abrindo mão do emprego com carteira assinada para trabalhar como autônoma e ingressar na mesma universidade que a filha, cursando Medicina Veterinária ao seu lado. Juntas, enfrentaram cinco anos de graduação em uma universidade localizada no campus Vargem Grande.

“Não foi fácil, mas foi o que eu precisava fazer por ela. E, no fim, nos formamos juntas. Eu só queria que ela tivesse todas as condições para conquistar esse sonho. Ser médica-veterinária sempre foi o que ela quis”, afirma Cátia.

Mais do que apoiar nos deslocamentos ou nos trâmites burocráticos, Cátia foi aluna de verdade. Assistiu às aulas, estudou, fez provas, participou dos práticos. A dupla enfrentou juntas cada etapa da formação.

“Ela foi muito acolhida na faculdade. Desde a coordenadora do curso até a diretora, todos deram estrutura, base e apoio para que a Camila concluísse o curso que tanto desejava”, completa.

Antes da universidade, um episódio difícil quase apagou o brilho do sonho de Camila: o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). A jovem enfrentou condições adversas durante a prova, como ambiente gelado e ausência de adaptação na redação, apesar da solicitação: “Ela saiu da sala encharcada de suor, da cabeça aos pés, porque se agitava muito. Tentou verbalizar o que podia da redação e fez dez ou doze linhas. Quando saiu o resultado, ela achava que tinha tirado 4,5. Mas deram zero, alegando que a redação foi entregue em branco. Ela chorou muito. Sentiu que todo o esforço não valeu de nada”, relata a mãe. A família contesta judicialmente o resultado até hoje.

Diante da injustiça, Camila foi matriculada em uma universidade particular, onde encontrou um ambiente acolhedor.

Em 2023, realizou o implante de um dispositivo de Estimulação Cerebral Profunda (DBS, na sigla em inglês), que trouxe alívio significativo dos sintomas. Conforme explicado pela família, o tratamento é contínuo, mas os médicos explicam que, com o tempo, o cérebro se adapta aos estímulos, possibilitando melhor qualidade de vida.

A formatura, em novembro de 2023, foi um marco não apenas acadêmico, mas pessoal e familiar. “Ela passou por muitas etapas, muitas lágrimas, muitas batalhas. Mas chegou lá. O sonho se realizou”, celebra Cátia.

O pai, Luís Gustavo Belo de Moraes, também se emociona ao falar da filha: “É impossível não se orgulhar. A força da Camila nos ensina todos os dias. Ela não desistiu, mesmo quando parecia impossível. E a Cátia é uma mãe como poucas: abdicou de tudo para estar ao lado da filha. Esse diploma é da Camila, mas também é da família inteira”.

No dia 2 de maio de 2024, ao receber sua CIP no CRMV-RJ, Camila selou o início oficial de sua carreira. O momento foi marcado por emoção e significado: a jovem que enfrentou o preconceito, as limitações físicas, a incerteza do diagnóstico e as barreiras institucionais, finalmente viu reconhecido o seu direito de exercer a profissão pela qual lutou com todas as forças.

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